Façamos outro "suponhamos"
Asdrúbal só tinha olhos para o seu tesouro, aquela criança linda que gerara com Marineide. Pai mais babado não existia.
Marineide também adorava a garota, não só porque sempre sonhara ter uma filha, mas também porque considerava que o seu nascimento salvara o seu casamento de uma crise. Antes de ter dito a Asdrúbal que estava grávida, ele andava distante, sorumbático, enredado em polémicas estéreis no seu blog, irritadiço, praticamente sem trocar mais de duas palavras por dia com ela. A gravidez mudara tudo!
O tempo passou. Marineide adoeceu. Aquilo que à partida parecia uma constipaçãozita agravou-se, tornou-se coisa séria, houve necessidade de procurar especialistas. Uma hipótese louca surgiu na cabeça de Asdrúbal, quando a garota nasceu guardaram o cordão umbilical, as células estaminais não poderiam ajudar? Fizeram-se testes. Foram conclusivos em dois aspectos - não serviam para ajudar Marineide, que acabou por morrer em paz, e eram taxativos: Asdrúbal não era o pai biológico da criança, que agora contava já 5 anos de idade.
Asdrúbal foi-se abaixo. Não pela morte da esposa amada, não pela notícia fulminante da sua não-paternidade, mas sim pela interposição de uma acção legal. O grande amigo da mulher, o ombro amigo sempre presente, o padrinho da sua filha adorada!, apresentava-se como pai verdadeiro e exigia a custódia da sua filha. Na comunicação social foi um fartote, o pai biológico aparecia em entrevistas na televisão, tinha um sorriso colgate. Asdrúbal foi apresentado como um ogre, os vizinhos deixaram de lhe falar, na rua apontavam-lhe o dedo acusador. Cornudo. Ouvia constantemente cochichos, galhofas, risos. Cornudo.
Os advogados falavam-lhe em acordos fora do tribunal. Pode ser que consigamos negociar um direito de visita de 15 em 15 dias, diziam. Asdrúbal não entendia - mas ele pode roubar-me assim a minha filha?! Os advogados reagiam com estupefacção - mas ele é que é o pai biológico, ela é do sangue dele, a Lei está do lado dele, a Lei protege o sangue, você não é nada à criança, você não é nada, nada, desampare a loja, pense na criança, ele tem dinheiro, ele tem um sorriso colgate, ele é telegénico, você não passa de um cornudo...
Etiquetas: Adopção, Coisas sérias, Esmeralda, Justiça, Rantas
2 ComentÁrios:
Se, com este texto (que tem, inegavelmente, graça no estilo e é triste no conteúdo) pretendias de alguma forma apresentar um qualquer ponto de vista pessoal sobre aquilo que temos andado a discutir, confesso que não apanhei.
Ah, o cartaz que ilustra o post está bem apanhado.
Ranys,
Este texto é equivalente, no que tem de absurdo, ao teu post anterior com a Ivanete e o Melchior.
Acho que estás a valorizar demasiado o "poder do sangue", coisa a que eu não dou tanta importância como tu (nem pouco mais ou menos).
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