Os direitos dos espermatozóides
Ainda a polémica sobre o caso que levou o pai adoptivo a uma pena bárbara de 6 anos de prisão efectiva...
Em termos de Direito, o pai biológico tem a Lei pelo seu lado e tem toda a legitimidade para ficar com a criança. O pai adoptivo não tem quaisquer direitos - primeiro, porque não é efectivamente adoptivo, o processo não terminou. Segundo, porque apareceu entretanto o pai biológico a reclamar a filha. Poder-se-ia acrescentar ainda um terceiro ponto, que consiste no facto de ter andado a tourear a Justiça Portuguesa nos últimos 3 anos, mas ainda assim esse é um facto acessório.
O que é que cada um deles fez para que considere ter direitos sobre a criança? Um deles deu-lhe uma família, amor, uma casa e carinho durante quase 5 anos. O outro deu uma queca. Eis o real valor dos direitos do pai biológico - dá-se uma pinocada com uma tipa qualquer, e passados uns tempos batem-nos à porta a pedir sangue porque é capaz de um dos espermatozóides expelidos na altura ter atingido o alvo. Porreiro! Parece que tenho uma filha, pá. Que giro.
O que é ser pai, na realidade? É cuidar, educar, acarinhar, amar, ou é andar praí a bombar, sempre a abrir, e ter espermatozóides atléticos? Porque é que uma relação de uma noite - enfim, de uns 10 minutos, eventualmente - há-de ter mais peso para a Justiça Portuguesa do que uma relação estabelecida ao longo de 5 anos?
Etiquetas: Adopção, Coisas sérias, Esmeralda, Justiça, Rantas
3 ComentÁrios:
Sem dúvida que pai é quem cuida...mas neste caso o pai adoptivo só teria cuidade durante 9 meses (pelo que é escrito abaixo)
se não andasse a tourear a justiça. Parece-me que neste tema me sinto obrigado a concordar com o El Ranys.
Redus,
A decisão não foi tomada quando a garota tinha 1 ano, foi tomada agora, que ela vai fazer 5 anos daqui a cerca de um mês.
As decisões dos tribunais não têm o poder da retroactividade sobre a vida das pessoas.
Objectivamente, os dois "pais" têm razão. E deixam de a ter, por vários motivos.
Um porque andou a gozar com a justiça, o outro porque o seu único argumento se resume a uma queca que deu há tempos - e que, só pelo facto de, pelo que tem vindo a lume, isso ter sucedido com uma moça "liberta de preconceitos" (existiam inúmeros proto-candidatos à paternidade), significa uma certa inconsciência, nos tempos que correm. Usar preservativo é um imperativo :-)
Mas isso são outros quinhentos.
O meu ponto é que, entre os dois "pais", existe uma miúda. E existe uma Lei que dita que os seus interesses devem ser salvaguardados acima de tudo. E não foram. Se a decisão de entregar a moça ao pai biológico tivesse sido tomada há 4 anos atrás, não existiria este banzé, e eventualmente teria sido a decisão mais acertada, concedo.
Mas não foi isso que se passou. A sentença foi dada em detrimento dos melhores interesses dela, e é esse o único factor concreto pelo qual não posso concordar com ela.
Repara não tomo partido nem pelo pai biológico nem pelo pai adoptivo, nem contra um nem contra o outro. Tomo partido pela garota e contra a Justiça, cujo excesso de garantismo legalista, a todos os níveis, permite que as situações de resolução menos complexas se compliquem e se enredem de forma irreversível.
Caro Rantas, não sei que parte da leitura do Acrodão dispensaste, mas deixo-te aqui o essencial:
"Baltazar é notificado, nos autos de averiguação da paternidade comparecendo no tribunal (Sertã) perfilhando de imediato a menor no dia 24 de Fevereiro de 2003.
No dia 27 de Fevereiro de 2003 o pai biológico vai aos serviços do MºPº da Sertã dizendo que quer regular o poder paternal da filha, esclarecendo que desconhece o seu paradeiro mas que a irá procurar.
Em Setembro de 2003 (pela 1º vez) o casal apresenta-se no CRSS de Santarém como candidato à adopção.
A sentença de regulação do exercício do poder paternal é datada de 13 de Julho de 2004. O casal apesar de não serem parte é notificado de tal decisão."
Repara então, Rantas: a primeira sentença foi proferida há dois anos e meio, no dia 13 de Julho de 2004. Mas a perfilhação foi feita por Baltasar em 24 de Fevereiro de 2003 e, três dias depois, deu entrada no tribunal a acção de regulação do poder paternal.
Na altura, a Esmeralda tinha pouco mais de um ano e só tinha passado 9 meses com o casal. Aponte-se o dedo à morosidade da justiça, que demorou um ano e meio a proferir sentença num caso desta importância. Aponte-se o dedo ao casal, que quis fintar tudo e todos (com a melhor das boas intenções e cheios de amor, não ponho em causa). Aponte-se o dedo a Baltasar, que demorou muito tempo até assumir a paternidade. Agora, dizer que o casal tudo fez para proteger a Esmeralda, aí já tenho as minhas reservas. O casal, nesta história, não pensou nas consequências. Foi egoísta.
Hoje, a Esmeralda anda a monte, desaparecida, em parte incerta, com a mãe, e o Luís vai estar preso durante seis anos. É no que dá querermos dar a volta aos mecanismos legais de adopção. E diga-se, já agora, que esses existem para protecção das crianças e para evitar coisas tão sinistras como o comércio e tráfico de crianças.
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