terça-feira, janeiro 30, 2007

Aborto

Começou hoje, oficialmente, a campanha para o referendo sobre o aborto. No entanto, a discussão e a troca de argumentos entre partidários do SIM e defensores do NÃO já há muito tomou conta da praça pública, descambando as mais das vezes, como era previsível, em conversa de surdos. As posições de cada um dos lados extremam-se e ninguém quer ouvir ninguém. Na realidade, nesta questão, o debate não interessa.

O maior argumento dos defensores do NÃO é que a mulher que aborta deve continuar a ser vista pelo Estado como uma criminosa que está a pôr fim a uma vida humana. Compreendo o ponto de vista, mas não percebo porque não defendem então a equiparação penal do crime de aborto ao crime de homicídio. Ou valorizam mais uma forma de vida humana (a dos já nascidos) em relação a outra (a dos concepturos)? É que, deste ponto de vista extremo, não há relativismos. Se já é vida humana, o crime deve ser o de homicídio.
Obviamente, ainda não ouvimos nenhum partidário do NÃO a defender esta equiparação. Então, também para os partidários do NÃO, a vida intra-uterina é distinta da vida após o nascimento. Esta “vale” mais do que aquela. Também para eles.
Sendo então uma vida distinta, cai por terra o argumento do “coração que bate”.

O aborto existe. Continuará a existir, seja qual for o resultado do referendo.
Qual a melhor maneira de o Estado lidar com o assunto? Fechar os olhos e assobiar para o ar, perseguir e punir quem aborta ou tudo fazer para que o aborto, quando reflexo de uma decisão irreversível da mulher, seja realizado em condições clínicas mínimas?

Creio que a única via civilizada é esta última. A decisão de abortar é pessoal, de cada uma das pessoas (da mulher, do casal) que a toma. Para as que acham que abortar viola as suas consciências, a sua ética e a sua moral, o caminho é certo: não abortar.

Para as outras, o problema de consciência também se colocará, decerto. Mas ficarão a saber que, seja qual for a sua decisão, não se tornarão criminosas perseguidas e que não se sujeitarão às mais hediondas práticas de exploração económica de “estados de necessidade”. Para quem acredita na prevalência da escolha individual sobre a colectiva, como eu, a única via é aceitar que quem decide não dar continuidade a uma gravidez indesejada o faz por razões ponderosas, que só a própria pessoa pode avaliar (pode e deve o Estado, despenalizando o aborto, auxiliar as pessoas nessa avaliação) .
Desejavelmente, ninguém abortaria em Portugal. Mas que o aborto existe, lá isso…SIM!

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1 ComentÁrios:

Blogger Rantas disse...

Concordo inteiramente com esta visão

30 janeiro, 2007 21:54  

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