terça-feira, novembro 22, 2005

Os vampiros

No céu cinzento sob o astro mudo
Batendo as asas pela noite calada
Vêm em bandos com pés de veludo
Chupar o sangue fresco da manada
Zeca Afonso, Os Vampiros





A sociedade portuguesa encontra-se cada vez mais dividida, antagónica, injusta.
A divisão é cultural, social, económica.
Função Pública para um lado (os "privilegiados"), privados para o outro.
Gente que trabalha e paga impostos contra a turminha da fuga ao fisco.
Gentinha que acha que João Pedro Pais é um grande poeta (aaaargh!).
Que classe social (ou profissional) te choca mais em Portugal? Sim sim, estou mesmo a falar contigo, a ti que estás a ler isto.
Muitas classes poderão ser consideradas. Haverá quem acuse os patos-bravos da construção civil, para outros os fiscais da EMEL representam o ocaso da civilização, há quem apresente os adeptos benfiquistas como prova de que Deus não existe ... enfim, haverá de tudo.
Estou convencido, no entanto, que o resultado de um inquérito destes teria como resultado quase único a classe política. E isso é dramático para todos nós: o facto de vermos os nossos eleitos como chupistas, ladrões, corruptos é péssimo.
Não acredito em profetas da desgraça - se X ganhar as eleições, vem aí o revanchismo, a ditadura, o populismo, os fuzilamentos, o aborto obrigatório, o casamento entre homossexuais (riscar o que não interessa).
Mas incomoda-me muito, mesmo muito, que as pessoas que têm a cargo a condução do nosso país tenham esse estatuto. E o mais incómodo ainda é concluir que essa imagem corresponde, por demasiadas vezes, à verdade - ou seja, que é por culpa exclusiva dos políticos portugueses que em Portugal se chegou ao grau zero da política, onde quem vai para lá são as pessoas que têm menos escrúpulos de ordem ética. E estou a utilizar um eufemismo, para que isto não se converta numa gritaria ("Só querem é poleiro. Chulos! Chulos!").
O que fazer para ultrapassar este beco sem saída, em que a actividade política, de tão desprestigiada, tende a atrair gente cada vez menos qualificada?
Não sei.
Virar as costas aos políticos profissionais? Não me parece ser a melhor solução. Chega de amadores, não? Sinceramente, não sei. Mas não devemos, em hipótese alguma, fechar os olhos a situações menos próprias - há que alertar, denunciar, gritar, barafustar.
O caso Eurominas. Que promiscuidade! Ex-ministros a sacarem indemnizações ao Estado. Indemnizações essas que o Governo a que pertenceram negou terem razão de ser!
O caso das reformas dos políticos, anunciado por Sócrates como exemplo do combate aos privilégios. Que vergonha! Deputados a atrasarem o envio para a promulgação, texto da lei mal elaborado propositadamente, tudo para que os novos autarcas ainda apanhassem a lei antiga. E os autarcas que se prestaram a isso, antecipando as cerimónias de tomada de posse para manterem os seus privilégios.
Alguém já perguntou a Carmona Rodrigues, por exemplo, porque antecipou a cerimónia - do início de Novembro para fim de Outubro? É triste termos estes políticos. E dá vontade de chorar quando nos lembramos da alternativa que tínhamos a este - o político-filósofo, o Rei-Sol iluminado que nos queria demonstrar que é muito inteligente e muito elegante, com boa pinta, com uma esposa bárbara, o mal foi o povo, esse camelo, não ter entendido as suas propostas!
Bom - vou terminar por aqui. Hoje estou a sentir-me deprimido. Mas que raio de post comecei eu que deu nisto?!

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4 ComentÁrios:

Anonymous Anónimo disse...

Realemnte a duvida está em saber se estes politicos sao o resultado do estado a que chegou a nacao ou se o estado da nacao é o resultado do estado a que chegaram estes politicos!

22 novembro, 2005 08:31  
Blogger Alex disse...

A minha opinião é que os políticos são o resultado da História e do Povo Português. Eles não são diferentes do resto dos Portugueses. Acho, por exemplo, que o Sócrates teve a oportunidade de finalmente mudar qualquer coisa, mas parece-me que a perdeu. Apenas está a acabar com algumas aberrações. Não está a fazer o que seria necessário, e que mais tarde ou mais cedo se fará.
Saúdinha

22 novembro, 2005 23:12  
Anonymous Anónimo disse...

Concordo que o Socrates teve a oportunidade nas maos mas, infelizmente, nao tem tempo...

Esse mais tarde ou mais cedo.... o problema é que quando a mediocridade se instala ela torna-se a própria referencia e a partir daí só mesmo uma 'revolucao' consegue mudar as coisas. E esta revolucao nao estou realmente a ver quem a possa fazer.

23 novembro, 2005 11:21  
Anonymous Anónimo disse...

estou à vontade para falar porque não sou socratista e muito menos socialista, mas nos últimos 30 anos quantas pessoas estiveram envolvidas na governação de portugal? seriam todas assim tão más? o que eu acho é que os partidos, mas sobretudos os governantes, estão demasiadamente dependentes de lobbys – normalmente aqueles que os ajudam a subir ao poder - e por isso a capacidade para criar roturas acaba por ficar sempre coarctada pela força desses mesmos lobbys; assim se compreende que este país esteja há mais de trinta anos à espera de reformas nas justiça, na educação, na saúde, na defesa; assim se compreende que a cada mudança de governo se inverta o rumo e se ande a ziguezaguear entre uma e outra opção estratégica; assim se compreende a tão elevada correlação entre a ocorrência de eleições e a tomada de decisões de maior ou menos impacto no indivíduo comum

24 novembro, 2005 21:04  

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