quinta-feira, janeiro 19, 2006

Eu, Manifesto

Eu, Malagueta, cidadão votante deste Portugal, declaro sobre os candidatos cujo nome vou ver no boletim de voto no próximo domingo. Por ordem de sorteio.

Garcia Pereira, O Totalista
Presidenciais, Legislativas, Autárquicas, e suspeito - a ignorância, e falta de tempo, não me permite confirmar - também para a Junta de Freguesia. É impressionante, o homem vai a todas. Parece um forcado, cheio de gana e genica, que mal vê sombra de um boletim de voto agarra-se a ele sem dó e compaixão - principalmente por nós que nos cansamos de o ver calcorrear os noticiários televisivos a reboque da imparcialidade mediática.
A mim lembra-me um daqueles tios por quem não tenho uma especial ligação afectiva, mas que me habituei a ver em todas as reuniões familiares. No dia que deixar de aparecer se calhar vou-lhe sentir a falta. Agora, não.

Aníbal Cavaco Silva, O Falso Messias
Não gostando da personagem, e não querendo que saia vencedor destas eleições, também não me parece que a democracia portuguesa esteja em perigo, ou que venha especial mal ao País, por o termos como presidente. Não. O que me irrita solenemente é ver o equívoco histórico que infecta a percepção de quase metade dos meus concidadãos.
Essa ideia peregrina, que até já deu canção no folclore da campanha, que o candidato Silva é competente, honesto, e nos vai salvar a todos e ao País. Aos meus olhos isto é falso e trai os factos, para além de ser tão demagógico que o Bloco de Esquerda deve andar com ciúmes. Senão, veja-se.
O candidato Silva conduziu os destinos do Governo durante 10 anos e o que é que aconteceu? Portugal teve o maior impulso de desenvolvimento económico e social do período pós-25 de Abril. É verdade. Mas devemo-lo a ele, ou ao dinheiro e directrizes da União Europeia, que provocaram alterações profundas na organização económica do país e explodiram a diminuta capacidade de investimento do Estado? Este senhor mudou alguma coisa de estruturante e relevante na forma como o Estado vai à sua vida? Da cabeça do seu Governo veio alguma orientação estratégica para o país que tivesse efectivamente resultado em algo mais do que uns inflamados discursos de circunstância para enganar a populaça? Gastou-se uma pipa de massa para colocar um satélite em órbita, é certo (ó Pátria, levantam-se as almas!), mas o país mudou para melhor?
Não. Não mudou.
Não bastante ainda tivémos de aturar a sua pose de superior inteligência que tudo sabe e tudo resolve.
Para mim, a grande infelicidade de toda esta história é que esta imagem messiânica que parece existir do candidato Silva não o seria se esse grande palerma que dá pelo nome António Guterres não tivesse deitado por terra a confiança de um Portugal que acreditava.
A fechar, lembro-me ainda que nos tempos idos este senhor tinha hesitações sobre a União Europeia (oh, Thatcher, volta para trás), e o Santana Lopes como Secretário de Estado da Cultura (?!).
Candidato Silva, não obrigado.

Francisco Louçã, O Iluminado Canhoto
Rapaz dado aos livros e ao estudo sério, eminente farol do economês luso, é orgulho supimpa de uma certa esquerda burguesa que aprecia as coisas boas da vida, e se revê numa ideia de último reduto independente das maquinações partidárias. Especialista das contas, e perito na palavra, daria um espectacular líder de direita. Mas deu-lhe para o outro lado e assim se perdeu uma bela oportunidade política. Até porque daquele lado da barricada a questão resume-se a ver por quanto tempo ainda os comunistas de bifana à boca vão resistir à marcha do tempo.
E, embora até o compreenda, não aceito a instrumentalização grosseira que o BE, com o Francisco Louçã à frente, tem feito destas eleições assumindo-as despuradamente como um tempo de antena para programas de governo.
Até lhes prefiro os comunas. Sempre são mais típicos, com o Avante e a foice.

Manuel Alegre, O Poeta Excursionista
Um pulinho à raia para ver o sítio do pulo para a fuga do exílio. Um beijo no busto do Miguel Torga porque este homem era - e ainda é - grande. Uns tirinhos aos pratos para prazer dos senhores telespectadores que assim podem ver como eu amo a terra-pátria. Conhecem aqueles folhetos para excursões de terceira idade? Do tipo "Visita a Fátima. Com partida de manhã da Praça das Cebolas, passeio pelo Santuário, oferta de uma imagem da santinha. Volta a Lisboa. Asterisco: Farnel não incluído". É o que esta campanha do Manuel Alegre me faz lembrar. Se calhar como negócio tem pernas para andar - Viagens À Memória da Democracia -, mas como proposta de candidatura não vai longe. É irrelevante e inconsequente.
O melhor resumo de substância que vi do Manuel Alegre foi-me dado por uma peixeira de Matosinhos - grande terra! - quando ele por lá se passeou em homenagem-que-depois-não-foi ao falecido Sousa Franco. Dá um grande chocho no candidato e dispara à queima-roupa: ó Senhor Doutor, você é o mais giro deles todos.
Coisa que deve ter deixado o Manuel todo Alegre.

Jerónimo de Sousa, O Risco no Disco
Confesso que me sinto dividido pelos comunistas. Por um lado, admiro-lhes a constância de ideias e ideais. Pelo outro, cobro-lhes a incapacidade de se adaptarem ao mundo de hoje. Se há partido necessitado de uma 'terceira via' é o PCP. Era útil para eles e para nós, porque considero que a paisagem política nacional precisa do PCP para meter umas buchas polémicas no Parlamento. Senão quem é que vai defender as causas do aborto, da regionalização, e outras coisas importantes de se falar, que tantas vezes caem pelo chão vítimas das oportunidades do Bloco Central. O BE é que não é, porque pelo meio de tanta demagogia barata acabam por ser desonestos.
Quando o Jerónimo apareceu nas legislativas o homem surpreendeu os Portugueses com um discurso mais simpático e menos institucional. Falou com palavras mais simples e mais familiares, distante da praxis comunista. Depois de décadas de Cunhal a coisa fez alguma mossa e segurou o eleitorado. Mas chegou a hora desta campanha e o que é que se ouviu? A lenga-lenga do costume, mas agora pior, sem o apelo e simpatia da outra vez. É pena porque o Jerónimo perde, o PCP perde, e o País e nós também.
Até amanhã, camaradas.

Mário Soares, O Pápa-Pátria
Velhote, o tanas. Devia ter sido o grito de guerra da entourage socialista para esta campanha. É verdadeiramente incrível a resistência que mostra aos 81 anos. Impressionante!
É verdade que vê-lo novamente sentado na cadeira da Presidência não é coisa que me leve às lágrimas, mas de todos os que se apresentam a votação ainda me parece a melhor escolha. Porque se é para olhar para um passado de combate pela democracia o homem bate-os aos pontos. Porque se é para olhar para um passado de interesse pela economia do país os acordos do FMI - que foram difíceis e polémicos, mas necessários -, e a opção decidida por um futuro europeu, demonstram-no efusivamente. Porque se é para olhar para um passado de capacidade de leitura estratégica a crítica feroz à guerra do Iraque não deixam margens para dúvidas.
Porque não há melhor.

9 ComentÁrios:

Blogger Rantas disse...

Bom regresso, Malagueta.

21 janeiro, 2006 00:07  
Blogger El Ranys disse...

Malagueta, eu te saúdo.
Belo naco de prosa. Pena é a conclusão.
Estou em minoria, no blog. Sou o único a votar em branco. Será que isto vale como sondagem?

21 janeiro, 2006 00:38  
Blogger Dever Devamos disse...

Malagueta,
Comecei a ler e tive parar na parte do Cavaco; tive o azar de conhecer pessoalmente o Rantas e acabei por vir parar a um antro de socialistas.

A outra metade dos nossos concidadãos, a vossa metade, continua a desvalorizar o trabalho de Cavaco com o argumento que foram os fundos europeus que "fizeram" o trabalho. É um "ovo de Colombo": outros já lá passaram com os mesmos fundos e não vão deixar marca nenhuma.

E dizer que nada mudou parece-me injusto; façam um esforço de memória a ver como eram as coisas na década de 80 e vejam como estão agora. e atrevam-se a dizer que nada mudou.

22 janeiro, 2006 19:06  
Blogger Rantas disse...

Dever,

Estás a ser injusto. Eu convidei-te para o Revisão da Jornada por seres sportinguista, não para o Revisão da Matéria porque aqui ou somos monárquicos (!) ou votamos em Soares :D

23 janeiro, 2006 00:24  
Blogger El Ranys disse...

Eh, ó Dever, aguenta lá os cavalos,

1 - Quanto ao convite, acho que o Rantas já to explicou aqui em cima.

2 - "Antro de socialistas"?????
Mas onde é que tu percebeste que eu sou socialista? Ou, já agora, o Malagueta? (quanto ao Rantas, ele que te explique se é ou não é. Eu também ainda não percebi bem).

Sabes, aqui a coisa é um bocado diferente do Revisão da Jornada: não é Sporting/Benfica, Banco/Preto.

23 janeiro, 2006 01:15  
Blogger Dever Devamos disse...

Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

23 janeiro, 2006 18:54  
Blogger Dever Devamos disse...

Caros socialistas, monárquicos e afins.

Não foi minha intenção ofender ninguém. Acho que ser socialista ou monárquica é tão aceitável como ser do Benfica. Cada um carrega a sua cruz.

Quanto às "revisões" é certo que as minhas berlaitadas pertencem ao "da jornada", mas por afinidade acabo por dar sempre uma espreitadela ao "da matéria". E quando entendo que o devo fazer comento.

Conheço bem o Cacém, até porque morei quase a minha vida toda na linha Sintra. Não me parece é que um mau exemplo (mesmo que seja uma linha inteira) invalide a comparação entre o antes e o depois. Mas Malagueta, como havia dito não tinha lido o texto até ao fim.

23 janeiro, 2006 18:58  
Blogger El Ranys disse...

Vais de mal a pior, Dever...
"...tão aceitável como ser do Benfica."????
E desde quando isso é aceitável? Irra!

Mas fazes bem em vir aqui espreitar e em comentar. Aliás, faz destas caixas de comentário a tua casa. Mas há limites: não nos confundas com socialistas e, sobretudo, com benfiquistas...

Abraço

23 janeiro, 2006 19:25  
Blogger Dever Devamos disse...

Ok...Ok. Estava a brincar.

Acho que ser do benfica não é aceitável. Fui ofensivo. As minhas humildes desculpas.

23 janeiro, 2006 21:35  

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